Os autistas, crianças e jovens, meus alunos, quando me
olham,abraçam-me, aproximam-se de mim, não querem saber se sou crente ou ateu,
cristão, judeu, muçulmano. Seja lá quem for. Se estou gordo ou magro, se sou
bom ou mal, se tenho estudo ou deixei a escola pela metade, se sou hétero ou
homossexual, se sou rico ou escasso, se sou feio ou bonito, se sou negro ou
branco, se tenho problemas ou vivo sem eles, se luto por uma causa ou sou
alienado. Não. Eles apenas são.
Estão sempre prontos
a me afagarem. A me responderem do jeito que são e não como eu queira que deva
ser a resposta. Eles apenas são.
Eles não estão
nem aí para o que penso, ajo ou tenho como referência algo que acho seguro e
fiel para a minha vida.
Eles não estão
nem aí para o que eu acredito, sinto, penso ou suponho.
Eles apenas me
olham. E no seu olhar muitas vezes me pego pensando o quão despretensioso é
este olhar. Sem querer retribuição ou sentido. Apenas um olhar de ser para ser.
E me veem como ser humano, simplesmente. É neste olhar que mergulho e sinto um
mundo de liberdade, de não ter regras, de não ter rótulos, de não ter normas e
classificações, de não ter crenças... E me subjugar ao “não ser”.
Queremos enquadrá-los
num mundo que nós acreditamos ser o ideal, ser o real. Muitos são os métodos
que tentam fazer funcionar isto. Mas não é assim que acontece. Não é assim que
as coisas funcionam. E com todos os métodos que consideramos válidos do nosso
ponto de vista e crença, tentamos nos esquivar da real situação que nos
incomoda não por estarmos diante de um autista, mas pelo simples fato de termos
o sentimento que podemos regular tudo e que tudo deve estar de acordo com o que
pensamos e acreditamos. Fora isso é heresia, é o incorreto, é o absurdo. Mas este autista com seu comportamento, sua
comunicação e sua relação conosco foge dos padrões que impomos a nós
mesmos. Aí, ficamos atônitos. Tontos.
Porque os autistas nos colocam em situações desafiadoras. Desafiadoras para
nós. Para eles, não. Porque não
aceitamos que ninguém afronte nossos sagrados conceitos, comportamentos e ideias
do que é certo ou errado, tão promulgados por nossos ancestrais que nos
disseram que o que eles pensaram e estudaram é a verdade incorruptível.
Sou professor.
Mas não sou um professor. Sou professor de autistas. E eles não estão nem aí
para isto. O que importa?... Eles.
Nilson Costa Filho
Pedagogo e Psicomotricista/Terapeuta
Nenhum comentário:
Postar um comentário